domingo, 9 de janeiro de 2011

Gincana Cultural - 18/10



No dia seguinte, acordamos cedo e tomamos um belo café da manhã no salão de chá da pousada, denominado o Condestável. Vai entender. Apesar da indisposição, meu caçula foi um bravo. Nos acompanhou no passeio, durante todo o dia, reclamando só um pouco. A primeira parada foi na Catedral de Évora, ou, como consta nos livros, Basílica Sé Catedral de Nossa Senhora da Assunção. A entrada é majestosa, com um imenso portal de madeira, ladeado por duas torres bem robustas que sustentam, no alto, três enormes sinos que ecoam por toda a cidade a cada hora. Ladeando o portal, estão as esculturas dos apóstolos datadas do século XIV. Além do pórtico principal há ainda mais duas entradas: a Porta do Sol, virada a sul, com arcos góticos e a Porta Norte, reedificada no período barroco. Mas não vimos nenhuma delas. Não sei se estavam em obras ou se foi desatenção mesmo.

A verdade é que nos distraímos na entrada com a figura de um possível frei franciscano capuchinho que meditava num canto da escadaria. Não concluímos se era um frei mesmo, se algum devoto cumprindo promessa ou se um ator contratado para atrair o público, numa clara estratégia de marketing. O fato é que nos distraímos com ele e com as inscrições esculpidas nas pedras da escadaria. Decifrem-me ou vou devorá-los! - dizia ela para nós.

Sem mais confabulações, adentramos a catedral, a maior de Portugal e uma das mais antigas, com 700 anos de idade. Dizem até que as bandeiras da frota de Vasco da Gama foram abençoadas ali, no ano de 1497. O seu interior é distribuído em três amplas naves, como nos explicou um senhor que ciceronava o grupo ao qual nos juntamos. Na nave central está o altar de Nossa Senhora do Anjo, chamada pelos evorenses de Senhora do Ó. Que coincidência, hem? Também temos aqui perto de BH, em Sabará, a nossa Igrejinha de Nossa Senhora do Ó, um tesouro! Nesta nave estão ainda as imagens de Nossa Senhora e do Anjo Gabriel, esculpidas em mármore policromado, o púlpito e o órgão de tubos, um espetáculo indescritível. Como informa a wiki, esse órgão foi construído pelo mestre italiano Pascoal Caetano Oldovini.

Nas laterais da catedral, abrem-se as capelas de São Lourenço e do Santo Cristo e as Capelas das Relíquias e do Santíssimo Sacramento. Não acompanhei toda a visita, porque o meu caçula preferiu sentar-se e fiquei com ele para fazer companhia. Sentamos bem ao lado de uma belíssima imagem de Nossa Senhora, protegida no interior de um pequeno altar de ouro. Não sei bem se a imagem é de N.S. da Assunção, mas babamos, apesar de estarmos acostumados com nossas igrejas barrocas, riquíssimas em ouro e imagens deslumbrantes.

Assim, perdemos uma parte do roteiro mas, depois, os rapazes nos contaram tudo. O altar da Sé, por exemplo, é um trabalho do século XVIII, obra do arquiteto J. F Ludwig. Foi esculpido em mármores brancos, verdes e rosas, trazidos de Estremoz (nem imaginava!), de Sintra e, claro, de Carrara, na Itália. No altar, está também um enorme crucifixo, chamado o Pai dos Cristos e uma pintura, essa sim, de Nossa Senhora da Assunção, obra inspirada de um pintor do barroco italiano, Agostino Masucci.




Depois de conhecer o interior da Sé, fomos visitar o claustro da catedral. É claro que o nosso consultor para assuntos aleatórios teve de explicar aos rapazes o que era um claustro. A primeira ideia que tiveram foi a de um quarto fechado, sem janela, abafado e que acabava provocando claustrofobia em que se arriscasse a visitá-lo. Chegaram até a cogitar suspender essa etapa do roteiro. Mas depois foram informados de que o claustro, ao contrário do que imaginavam, eram quatro corredores abertos, formando um quadrado, que guarda um belo jardim. Ali, no claustro, é onde os freis se recolhiam para rezar e meditar. O claustro da Sé era assim também e era tão bonito que eu e meu caçula ficamos por ali, enquanto o nosso consultor e meu primogênito continuaram a visita, subindo até a sacada que rodeia o alto da catedral e ainda o Museu de Arte Sacra. Mas foram bem sucintos ao comentar o passeio: muito bacana!


Da Sé, voltamos à Igreja de São João Evangelista, anexa ao Convento dos Lóios de Évora. A construção, de 1485, foi determinada pelo primeiro conde de Olivença, D. Rodrigo de Melo, para tornar-se o panteão de família. Mais uma vez, o nosso consultor para assuntos aleatórios foi convocado. Tudo bem, os meninos não estavam errados, mas, diria, desatualizados. Para eles, panteão é qualquer monumento dedicado aos deuses. É isso também, mas já naquela época o termo era utilizado para designar um mausoléu, onde estão enterrados os restos mortais de pessoas de famílias notáveis. Voltando à construção, apesar de ter sido erguida em 1485, o prédio sofreu muitas intervenções, algumas decorrentes, pasmem, do terremoto de 1755. Deu para sentir a dimensão da tragédia que se abateu sobre Portugal naquela época, né? Évora fica a 150 km de Lisboa!

A igreja fica ligeiramente recuada em relação ao prédio do Convento, onde hoje está instalada a sofisticada pousada dos Lóios. Não é só o destino do convento que me deixou bem absurdada. A entrada dessa igreja é uma contradição só. Suas escadas, em vez de nos levarem para o alto, mais perto de deus, nos conduzem para baixo. Achei isso muito curioso! Aliás, tudo é curioso nessa igreja. Quando entramos, por exemplo, percebemos que caminhávamos sobre as lápides dos túmulos da família Melo. Em um deles, anotei, está enterrado ou estão, não consegui decifrar o mistério desses nomes, D. Jaime Mª José Caetano Arnaldo Pedro Paulo Luiz Rafael Álvares Pereira de Melo, 14º Conde de Tentúgal e em outro D. Maria Domingas Francisca Clara Maxima Senhorinha Rafaela Gonzaga Souza e Ligne - mãe e 11ª Marquesa de Tentúgal. Foi muito, muito estranho. Mas, enfim, esse era o objetivo de D. Rodrigo de Melo, torná-la o panteão da família Melo. Foi bem sucedido.

Outra curiosidade: é proibido, expressamente, fotografar o interior da igreja. Não discordo da determinação, até compreendo bem e concordo, mas lamento, porque é uma obra belíssima e o único registro que tenho dessa visita, além das fotos do exterior, é um cartão postal, que vou procurar depois, porque já me esqueci onde guardei. As paredes do interior da Igreja dos Lóios são totalmente revestidas com azulejos estampados em azul, datados de 1777. Também em azulejos azuis, sete painéis retratam os passos da vida de S. Lourenço, um santo referência para a Congregação dos Lóios.

Depois da igreja, fomos visitar as salas de exposição. Lembro que era um espaço bonito, com janelas imensas e uma vista estonteante da cidade, mas lá também não era permitido fotografar. Uma pena, porque já estou esquecendo de muita coisa e as fotos nos ajudam a relembrar e reviver aquele momento registrado. Só sei que gostei do espaço; de alguns quadros imensos, retratando uma ou outra personalidade da igreja ou da família; de algumas peças de casa; e da varanda, de onde víamos, lá embaixo, um belo restaurante, montado no jardim interno do prédio. Será no claustro?

Dos Lóios, descemos a Rua 5 de Outubro em direção a dois novos objetivos: a Rua Duarte Nunes, que reúne histórias das nossas duas famílias e a famosa Capela dos Ossos. O primeiro alvo era caminho para o segundo. Isso facilitou muito a nossa vida e, em especial, a do nosso caçula que ainda penava com dores no corpo e na barriga. Maldito restaurante vazio!


Ao final da descida, chegamos na Praça do Giraldo, a principal de Évora, tipo o centrão mesmo. Essa é uma área bem movimentada, com cafés e mesinhas nas calçadas, um comércio bem montado e, no fundo, à direita, a bela Fonte Henriquina, toda de mármore e que, dizem, recebeu a primeira água vinda pelo aqueduto da cidade. A construção é de 1571 e foi classificada como monumento nacional em 1910. As datas me impressionam muito: 1571, ou seja, por aqui, no Brasil, ainda éramos uma comunidade de índios sem noção do mundo lá fora.

Bem em frente a fonte, está a Igreja de Santo Antão, um exemplar da arte da Renascença em Évora, segundo me informaram. Não entramos nessa igreja e, por isso, não vimos a pintura do painel Almas, atribuído a Jerónimo Corte Real, o Vergílio português, autor de poemas épicos, como "O Segundo cerco de Dio" e "Naufrágio de Sepúlveda". Não lamentamos, porque tínhamos nossos objetivos.





Demos as costas para essa atração e seguimos nosso caminho praça abaixo, cortando ruas, becos e praças, sem nos desviarmos um milímetro da nossa meta, até avistarmos a placa amarela, com letras bem desenhadas: Rua de Duarte Nunes. Nossos duartes tem origens diferentes: um vem do Norte de Minas e outro da Zona da Mata e, provavelmente, os dois tem raízes portuguesas. Não vejo nenhuma chance dos nossos duartes terem vindo da Espanha e menos ainda da Irlanda, como supõem alguns estudiosos. Já o Nunes é português puro. Juntando os dois nomes, um reforça o outro. Mas isso não é nenhuma excentricidade no nosso Brasil. É o óbvio.


A alguns passos da Rua de Duarte Nunes fica Igreja do Convento Novo de São José. Tive vontade de conhecê-la e, quem sabe, trazer uma medalhinha de São José para minha mãe, mas entrou para a lista de próximos passeios. A igreja me pareceu bem bonita e deve guardar uma preciosidade no seu interior. Foi construída em 1728 a pedido do Cônego António Rosado Bravo. No seu interior, a decoração marca a passagem do Barroco para o Rococó. Deve ser bem parecida com nossas igrejas de Ouro Preto. Fiquei devendo.


Vista a rua que conta nossas histórias, fomos para o segundo alvo: a Capela dos Ossos. Não poderíamos deixar de conhecê-la, mas foi um passeio bastante macabro. todavia, se conseguimos entender os objetivos de seus criadores, essa impressão quase se dissipa. Bem na entrada da capela, que integra o conjunto da Igreja de São Francisco, um painel explica que "a Capela dos Ossos é um espaço de oração e meditação sobre a efêmera condição humana". E no alto do portão de entrada, está gravado: "Nós ossos que aqui estamos, pelos vossos esperamos". Será inevitável, mas a minha expectativa é de que isso irá demorar um pouco e por isso é bom que estejam sentados.


A Capela dos Ossos, construída no século XVII, foi obra de três monges fransciscanos. Suas paredes e os oitos pilares que sustentam a construção são cobertos por mais de 5 mil ossos e caveiras que os três recolheram dos túmulos das igrejas e cemitérios da cidade, tentando com isso reafirmar a nossa condição transitória na terra. Quem pensa que isso é coisa de português engana-se. Évora não é a única cidade do mundo a abrigar uma capela de ossos. Na República Tcheca também existe uma, a 60 km de Praga. É um ossuário com mais de 60 mil ossos humanos. Bem maior, portanto, que a capela portuguesa.
A ideia de usar os ossos para ornamentar a igreja da República Tcheca foi dos próprios monges do Mosteiro de Kutná Hora, que pretendiam apenas resolver o problema de superlotação do cemitério que ficava no mesmo terreno da igreja. Em 1515, um arquiteto foi contratado para fazer o trabalho e dar, claro, um significado mais nobre para a construção. E ele, claro, encontrou uma boa justificativa para seu projeto: conforme explicou, a Igreja de Ossos da República Tcheca simboliza a igualdade de todos os seres humanos perante Deus no dia do juízo final. Então tá.

Voltando a Évora, a Capela de Ossos parece mais uma instalação da Bienal de São Paulo do que um lugar sagrado. É tão impressionante a imagem das milhares de caveiras e ossos expostos em todos os cantos da capela e de mais dois esqueletos dependurados no alto do teto, que foi impossível, pelo menos para mim, me perceber no interior de uma igreja. A história dos dois esqueletos é ainda mais trágica. Contam que pertenciam a um padre da cidade que, na época da construção da igreja, teve um caso com uma mulher da região e, dessa relação, nasceu uma criança, que foi morta junto com o dito. Seus esqueletos foram ali dependurados para servir de exemplo. Eu, hem!



Saímos de lá um pouco irritados ou, talvez, não irritados e sim mais conscientes da nossa frágil condição humana. Em suma, os monges franciscanos alcançaram seus objetivos. Parabéns! Deixando de lado as emoções, admito que foi bom ter ido lá. Além dos ossos, a capela tem detalhes interessantes e algumas imagens muito bonitas, como este crucifixo que fica num dos lados da construção. Se um dia voltar a Évora vou querer rever a Capela de Ossos. Com o espírito preparado, acho que serei capaz de encontrar, bem dentro da minha alma, a humildade necessária para apreciá-la.

Cumpridos os nossos objetivos, retomamos o caminho de volta para pegar as bagagens no hotel e cair na estrada de novo, agora retornando para Lisboa. Subimos a 5 de Outubro sem muita pressa. Parei em quase todas as lojinhas para tentar comprar alguma lembrança de Évora, mas meus companheiros de viagem não tinham paciência suficiente para me deixar concluir um negócio. Homens! Estão certos, tinha muita dificuldade para me decidir, mas a culpa não era minha e sim da diversidade de objetos bonitos e interessantes que chamavam minha atenção. Queria todos ou, pelo menos, um de cada um e como queria tantos, não comprei nenhum. Mas enquanto arrumavam as malas no carro, consegui escapar e trazer pelo menos uns pratinhos pintados a mão que são maravilhosos. E na saída de Évora, ainda que de dentro do carro, conseguimos mais um tempinho para apreciar as muralhas que circulam toda a cidade.

sábado, 8 de janeiro de 2011

Estremoz - 17/10


Vixi, como o tempo passa! Não demora muito e essa viagem já estará comemorando o aniversário de três anos. Acho que já está é passando da hora de voltarmos lá, só que ainda não consegui nem terminar esse relato. Mas tudo tem uma explicação. Não consegui é porque o tempo passa mesmo e porque no meio do caminho vão surgindo outras aventuras, outras histórias, outros compromissos e tantos que não sobra nem tempo no fim do dia para dedicarmos ao ócio e a esses pequenos afazeres. Enfim, vamos no ritmo que é possível.

Estávamos, então, no dia 17 de outubro de 2008, em Portalegre. Mais precisamente, saindo de Portalegre, seguindo em direção a Évora. Iríamos direto se não fossem as outras histórias, as outras aventuras que vão surgindo no meio do caminho. A certa altura da viagem, vimos na estrada a placa de Estremoz. Gostamos do nome: Estremoz! E isso foi o suficiente para pararmos e passarmos os olhos na cidade. Foi só uma panorâmica mesmo, porque já estava entardecendo e tínhamos de chegar a Évora em tempo de encontrar um hotel e rodar a cidade.


Estremoz é muito clara e lembra as cidades dos antigos faroestes. As casas são brancas com barrados em amarelo, como Évora. Segundo o nosso Guia da Folha, a cidade foi posto-chave na Guerra da Restauração e depois na Guerra dos Dois Irmãos, de Pedro IV, o I do Brasil, um liberal, e o absolutista Miguel. Pedro venceu, mas os governos que se sucederam tinham todos a marca do reacionarismo. Lamentável. Mas a história é assim, sempre nos reserva surpresas.


E Estremoz também guarda as suas. A cidade fica no topo de uma colina, cercada por bosques de oliveiras. Reparamos nisso mesmo, mas como já estávamos acostumados com as oliveiras o que nos chamou a atenção foi o enorme portal de pedra com a bandeira de Portugal tremulando no alto, bem na entrada da cidade. Não posso garantir, pois não prestei atenção nesse detalhe, mas se as pedras desse portal forem de mármore, será muito natural. Estremoz é conhecida pelas suas jazidas de mármore branco, ou de mármore de Estremoz, como os portugueses mesmo dizem.

Sim, vimos as oliveiras, os pés de laranja capeta, as roupas dependuradas no varal e uma inscrição em homenagem aos combatentes. Não sei exatamente em qual combate atuaram, mas pregam três valores importantes: patriotismo, solidariedade e camaradagem. Vimos tudo isso, mas o que nos atraiu foi a aventura de atravessar o portal. O que estaria do outro lado?




Com certeza a Torre das Três Coroas, uma obra do século 13, toda de mármore, com 27 metros de altura. Mas tenho de confessar que não olhamos para o alto. Fomos a Estremoz e não vimos a torre nem a Capela da Rainha Santa, toda revestida de azulejos, com cenas da vida de Isabel, mulher do Rei Diniz. Isabel morreu em 1336, em Estremoz. Isso mostra a importância que a cidade já teve, mas nós não pudemos confirmar, pois não vimos a Capela da Rainha Santa. Também não vimos e nem fomos ao mercado nem ao Museu Municipal e em nenhuma outra igreja. Não passamos do primeiro quarteirão, porque vocês já sabem. O que consegui registrar foi essa torre, escondida atrás de um prédio branco. Quem sabe uma igreja, quem sabe a Capela da Rainha Santa. Ou não. Da próxima vez serei mais cuidadosa.

O que vimos, no estacionamento que ficava logo a esquerda, depois do portal, foi uma frota de carrinhos que pareciam de brinquedo e que deixaram os meninos babando. Do outro lado, vimos a Praça de Touros, uma construção recente, de 1904. Vimos só a Praça, mas as touradas ficaram para uma outra vez.






E vimos a escultura de um touro, que parecia um desenho de Picasso. Demos uma volta e meia volta para retomarmos a estrada. Foi mesmo apenas uma passada de olhos.







A Praça de Touros de Estremoz estava completamente vazia e, para ser sincera, mais do que vazia, abandonada. Eu tive essa impressão. E o monte de entulhos espalhados ao lado de uma lixeira, a poeira da rua, um certo cansaço, tudo isso, me deixou um pouco confusa e me fez lembrar, não sei porquê, de filmes de faroeste. É claro que essa relação foi indevida e completamente inapropriada. A proximidade da fronteira com a Espanha explica muito mais a paisagem da cidade do que as minhas impressões, nem sempre muito precisas.

domingo, 29 de novembro de 2009

Évora - 17/10


Chegamos em Évora já de tardinha. Eram 17 horas. A primeira impressão da cidade, a que fica, é a de que estávamos entrando em Ouro Preto. Uma Ouro Preto mais alegre, mais iluminada, mas com o mesmo movimento de gente indo e vindo, com os sobrados beirando as ruas, as lojinhas de uma porta só, vendendo lembrancinhas da cidade e os bares lotados de mochileiros. Ficamos confusos e desorientados: onde encontraríamos um Ibis para ficar? É claro que no meio da muvuca seria impossível. Melhor e até mais divertido seria buscar uma pousada num sobrado antigo, bem ao estilo da cidade. E aí foi bem mais fácil.
Estacionamos próximo às duas primeiras grandes atrações da cidade: as ruínas de um provável templo romano do século 2ºou 3º d.C. dedicado à deusa Diana e a Catedral de Évora, uma construção iniciada em 1186 e concluída em 1250. De lá, descemos a rua Cinco de Outubro e, na esquina da Rua de Diogo Cão, encontramos a nossa morada: Residencial Diana.

Como idealizamos na nossa caminhada, a pousada estava montada num sobrado muito simpático e antigo. Tudo bem, nem tão antigo assim quanto imaginávamos, mas do início do século passado, de 1914. Os quartos que conseguimos ficavam no andar da rua, ao lado da sala de televisão, mas eram muito acolhedores e nos faziam sentir hospedados em uma casa de família. E não tivemos nenhum problema com o barulho da rua nem com o som da televisão. Primeiro, porque às 11 horas da noite, mais ou menos, a rua já estava deserta. As pessoas estavam recolhidas aos seus aposentos ou, então, em outra área da cidade, dedicada às casas noturnas. Depois, não fomos importunados por nenhum plim-plim, porque ninguém vai a Évora para ficar sentado num sofá assistindo televisão, né? Venhamos e convenhamos, seria o maior programão de bobo. Os dois quartos tinham ainda outra vantagem: tinham casa de banho privativa. Isso foi muito bom!

Acomodamos as malas nos quartos e ainda saímos para dar uma volta na cidade, antes do jantar. Paramos primeiro nas ruínas do Templo de Diana, no Largo do Conde de Vila Flor. Foi impossível não nos lembrarmos da nossa própria Diana, uma whippet completamente desorientada. Sua brincadeira predileta era correr atrás do seu próprio rabo. Era tão querida, que os meninos inventaram até um refrão para a danadinha: Diana Rainha Daka, seu dilema é hiputinaka. Mas isso foi só uma divagação, até um pouco grosseira, pois as duas dianas nunca deveriam ser comparadas. Se bem que, não fui a primeira a cometer uma heresia dessa ordem. As ruínas do Templo de Diana, antes de serem resgatadas, por volta de 1870, foi usada como arsenal, teatro e matadouro. Isso mesmo, matadouro, sabe-se lá de quê.

Bem em frente ao Templo de Diana, vimos ainda o Convento dos Lóios, um mosteiro do século 15, transformado numa luxuosa pousada estatal. Vimos só por fora e parece muita bonita, mas os hospedes, pasmem, dormem em celas e jantam nos claustros. Achei muito estranho. No dia seguinte concluímos a visita, para conhecer a Igreja dos Lóios e as salas de exposição do Palácio. Depois volto aos Lóios, pois antes dessa visita, demos uma volta no Largo e voltamos a pousada para tomar um banho e sair outra vez para jantar. Esse jantar tem uma história.

Já eram mais de oito horas e estávamos realmente famintos. Descemos a Rua Cinco de Outubro para encontrar um restaurante que nos atraísse. Vimos dois bem simpáticos, mas já estavam lotados. Próximo deles, encontramos outro totalmente vazio. Não desconfiamos de nada e entramos animados para fazer um pedido bem especial. Tudo correu muito bem, fora o pedido do meu caçula, que tinha um nome estranho e o prato era ainda mais estranho.
Infelizmente, ou felizmente, porque certos fatos merecem mesmo ser esquecidos, hoje não consigo mais me lembrar o nome das coisas esquisitas que ele comeu. Seja o que for, não desceu bem e, a partir desse dia, o pobrezito penou com uma dor no estômago danada e ficou a base de água prata. Aprendemos a lição: restaurante vazio não é sorte, é um sinal de alerta. Não arrisquem, porque, com toda a certeza, o diabo é ruim mesmo. Fujam dos restaurantes vazios, onde for que estiverem. Prefiram sempre aqueles lotados, com gente saindo pelo ladrão, pois essa é a prova de que a cozinha ali é de boa qualidade.